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Mulé machista, a culpa é nossa

As dançarinas do Faustão viraram tema numa roda de conversa quente, outro dia. O preconceito fez com que as mulheres ali apontassem o dedo para as dançarinas, como se elas fossem putas a vender o corpo na TV. Nunca soube de uma dançarina do Faustão que se prostituísse – e pra mim é indiferente. Mas, lá pelas tantas, era como se as moças fossem as verdadeiras culpadas por todo tipo de constrangimento que as mulheres do mundo sofrem diariamente. Não só a dançarina do Faustão, mas todo tipo de “piriguete” que passeia por aí.

Elas são donas do próprio corpo. E devem vestir-se como quiser

Elas são donas do próprio corpo. E devem vestir-se como quiser

Sempre desconfiei que há mulheres mais machistas que muitos homens. Neste dia, tive certeza. E não é que uma das garotas com quem conversava atribuiu às piriguetes parte da culpa ~atenção!~ pelos homens estúpidos que assobiam e vomitam grosserias pra qualquer mulher que passa por eles na rua? Na cabeça dela, funciona assim: se a menina não tem bom senso e passa vestida feito uma mulher-melancia na porta de uma obra, ela está provocando a reação grotesca dos homens. É como se o “vem cá gostosa” fosse uma resposta ao decote da moça, que na cabeça do marmanjo quer dizer “este decote é pra você”.

Não, meu caro, não é pra você!

Esse argumento quase que justifica o massacre psicológico contra a lendária Geisy Arruda – quem não se lembra? É possível questionar a índole da Geisy, que surfou na onda da esculhambação pra fazer alguma fama. Mas, famosa ou não, ela tem o direito de usar o decote que quiser, o vestido que quiser, e ser respeitada como outro ser humano qualquer.

Se o respeito estiver condiconado ao “bom senso” da mulher ao vestir-se, é preciso definir na Constituição o que é bom senso. O que pra mim é um decote normal, pro meu amigo pode ser exagerado. Isso dá a ele o direito de chamar alguém de gostosa na rua? Há quem diga que bom senso é usar burca. E agora, José?

Se você, mulher, ouve todo tipo de ofensa na rua todos os dias, é preciso ficar claro que a culpa é nossa. Dos homens. Nós temos que mudar. Vocês, não! Se a garota desfila na praia com uma tira de pano feita de biquini ou vai à balada com a polpa do bumbum à mostra, é problema dela. Você pode achar ridículo, achar bonito, admirar, virar a cara… mas não pode desrespeitar ninguém por causa disso. É crime e precisa ser visto como crime.

Até o Romário deu aula sobre o assunto.

Se o número de estupros ultrapassou o de homicídios, não é porque os decotes estão mais cavados. É porque os machos ainda têm muito chão pra percorrer na estrada evolutiva. Se cada dia aparece no what’s app umas quantas fotos de ex-namoradas fazendo sexo, não é porque a “vagabunda” se deixou filmar ou fotografar. É porque algum mau-caráter se aproveitou do conservadorismo da sociedade – que ainda não vê com bons olhos uma mulher que trepa.

(Ué, mas nós viemos de onde?)

Se eu fechar os olhos agora

Não me lembro de ter tido uma amizade arrebatadora aos 12 anos. Um daqueles amigos com quem você faz pacto de sangue, por quem arrisca a própria vida. Não me lembro, também, de ter dividido com um amigo – ainda aos 12 anos – aventuras de gente grande. Faço essa confissão com uma pontinha de inveja da infância que viveram Paulo e Eduardo: uma infância dura. E doce.

Hyères, 1932, de Henri Cartier-Bresson

Os dois amigos vivem em uma cidade no interior do estado do Rio de Janeiro. Estamos em 1961. Em uma tarde ensolarada de abril, Paulo abandona a aula maçante para ir ter com Eduardo em uma zona afastada da cidade, no meio do mato. À beira de um lago, os meninos encontram uma mulher caída, cruelmente dilacerada. Algumas facadas, o cheiro de sexo misturado ao de sangue, um seio extirpado.

A partir desse momento, que marcará para sempre suas vidas, Paulo e Eduardo iniciam uma investigação para encontrar o assassino da mulher. Suas descobertas, ao lado de um velho que encontram durante a saga, revelam múltiplos assassinos: uma sociedade hipócrita, políticos corruptos.

A busca de Paulo e Eduardo vai lhes custar, a cada um, o próprio destino. Estou falando do livro Se eu fechar os olhos agora, de Edney Silvestre. Mas mais do que discutir e desmascarar questões de uma sociedade enferma, o romance revela o sabor de uma amizade arrebatadora. Que se mantém intensa, ainda que se perca. E é isso, pelo menos pra mim, que transforma este livro em leitura obrigatória.

A fé, o sexo e nossa opinião

Edir Macedo e Bento XVI: opiniões contrárias sobre aborto, preservativo, homossexualidade...

É difícil escrever sobre religião despido de qualquer conceito ou preconceito. É difícil falar da fé sem ser acusado de leviano algumas vezes, algumas vezes de fanático. Afinal de contas, a fé é o que nos move depois da linha tênue que divide o nosso entendimento do inexplicável. Quando digo “nos move”, refiro-me a todos os seres pensantes, inclusive os ateus.

Não sou uma pessoa religiosa, apesar de ter minha fé. Mas já aviso ao leitor incauto que isso não me confere toda a independência do mundo para tratar de religião, sobretudo quando o assunto também se refere ao sexo, tema polêmico, ainda mais no campo da fé.

O que é sexo para você? Instrumento da reprodução humana, talvez? Um poço de prazer carnal, por que não? A concretização do amor entre duas pessoas, quiçá? Eu poderia inventar um sem-números de motivos pelos quais uma pessoa se entrega a outra na cama ou em qualquer outro lugar. Nenhum é mais ou menos verdadeiro que outro. Todos fazem sentido em algum momento.

E como a igreja lida com isso? Como nós lidamos com isso em relação à religião? Tabu.

Todo mundo tem uma opinião sobre sexo. Por esse motivo, discuti-lo sob a ótica da fé é uma boa maneira de discutir também o posicionamento das igrejas em relação a este e qualquer outro tema. Afinal de contas, acatar esses posicionamentos sem discuti-los é deixar que alguém tenha opinião por você.

A Igreja Universal do Reino de Deus, a maior entre as neopentecostais (consideradas mais radicais), inaugurou um movimento que pretende se posicionar contra as opiniões da Igreja Católica e, de quebra, abocanhar a fatia de fiéis que discordam das posições claras e ultrapassadas adotadas pelo Vaticano.

O catolicismo , por exemplo, recrimina o uso de preservativo e o papa Bento XVI deixou isso claro quando disse que a camisinha não deve ser usada nem no combate à Aids, contrariando a Organização Mundial da Saúde (OMS). Por outro lado, o líder da Igreja Universal, bispo Edir Macedo, se posiciona a favor: “No início do meu casamento, a Ester fez uso da pílula anticoncepcional durante quase um ano. Mas sentiu-se muito mal e teve de interromper. Como não havia a vasectomia, parti para o sacrifício: comecei a usar camisinha.”

Aborto é outra questão que coloca as duas igrejas em lados opostos. O Vaticano condena, claramente; a Universal defende o aborto a colocar uma criança no mundo sem recursos para criá-la dignamente. O catolicismo é contra a homossexualidade; Edir Macedo o tolera em seu blog. As duas igrejas tomam suas posições com base nos ensinamentos bíblicos e na palavra de Deus. Ambas se valem do divino e do inexplicável para tomar posições completamente opostas que dividem e disputam os fiéis. Ou seja: trata-se de interpretação.

Então por que nós mesmos não interpretamos a nossa fé e tiramos nossas as próprias conclusões? Como diz minha mãe: “Tua cabeça, teu guia”. Por outro lado, tirar conclusões sozinho significa não amadurecer as próprias ideias conhecendo discursos diferentes e variados. Isso é um poço de questionamentos, que voltam ciclicamente contra nós mesmos, chamado livre arbítrio. Até o bispo Edir Macedo já faz uso do livre arbítrio para não espantar parte dos fiéis com posições claras, como acontece com a Igreja Católica. Uma mulher chamada Amanda perguntou ao bispo, no blog dele, se sexo oral era pecado. Eis a reposta:

“A Palavra de Deus não fala nesse assunto em detalhes, mas como já escrevi num blog passado, tudo depende da sua fé. Se a sua consciência dói, é porque é pecado para você. Se não, é porque não é”.

Qual é a sua fé?